CONFAZ publica convênio sobre transferência interestadual de mercadorias
Foi publicado hoje, 1º de novembro de 2023, o Convênio ICMS nº 174/2023, que dispõe sobre a remessa (transferência) interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica.
O Convênio foi aprovado na última reunião realizada pelo CONFAZ, entre os dias 27 e 31 de outubro de 2023, como reação dos Estados ao que restou decidido pelo STF na ADC nº 49, na qual foi declarada a inconstitucionalidade dos dispositivos da LC 87/96 que previam a incidência do ICMS sobre a transferência de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, por não haver circulação jurídica de mercadoria nessa hipótese (transferência de titularidade). No referido julgamento, o STF assegurou ainda a manutenção dos créditos relativos às operações anteriores ocorridas na origem, bem como o direito de os contribuintes transferirem os créditos para os Estados de destino, caso os entes das Federação não editassem lei complementar a respeito da questão até o início de 2024.
O Convênio ICMS nº 174/2023 estabelece a obrigatoriedade da transferência de créditos de ICMS ao estabelecimento de destino, o que será realizado por operação, por meio da consignação do referido valor no campo de destaque do imposto na NF de saída. Para tanto, o estabelecimento de origem deverá lançar o ICMS a débito em sua escrita fiscal, em contrapartida ao lançamento a crédito do mesmo valor pelo estabelecimento destinatário, sendo respeitadas as mesmas regras de creditamento, caso a mercadoria fosse adquirida de estabelecimento de titular diverso. Em virtude da transferência, os créditos deverão ser reduzidos da escrituração do estabelecimento de origem, como se estivesse sendo realizada uma operação tributada com os mesmos bens e mercadorias transferidas.
O Convênio também estabelece que o ICMS a ser transferido para o destino corresponderá ao resultado da aplicação de percentual equivalente à alíquota interestadual incidente nas operações interestaduais sobre valores previstos a título de base de cálculo no referido diploma normativo.
Neste ponto, os valores de base de cálculo correspondem aos anteriormente previstos na LC 87/96 (declarados inconstitucionais pelo STF), com exceção das situações de transferências de mercadorias não industrializadas, que deixa de ser o preço corrente da mercadoria no mercado do remente para ser a soma dos custos de sua produção, assim entendidos os gastos com insumos, mão-de-obra e acondicionamento. Para a transferência, o ICMS deve ser calculado por dentro.
Além disso, o Convênio prevê a manutenção do saldo de créditos no estabelecimento de origem e que a utilização da sistemática do Convênio “não importa no cancelamento ou modificação dos benefícios fiscais concedidos pela unidade federada de origem, hipótese em que, quando for o caso, deverá ser efetuado o lançamento de um débito, equiparado ao estorno de crédito previsto na legislação tributária instituidora do benefício fiscal”.
O Convênio ICMS nº 174/2023 produz efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024, sendo que, para sua aplicação efetiva, será necessária a internalização de suas regras na legislação de cada Estado.
Importante ponderar que, no âmbito legislativo, ainda tramita o Projeto de Lei Complementar nº 116/2023 (anterior PLS nº 332/2018), apensado ao PLP 148/2021, de relatoria do Senador Fernando Bezerra Coelho, com as seguintes propostas de alteração da Lei Complementar nº 87/96:
Manutenção dos créditos de ICMS das entradas do estabelecimento/dispensa do estorno;
Regra de transferência dos créditos para os estabelecimentos localizados em outros Estados. Nesse caso, a transferência ficaria limitada à aplicação da alíquota interestadual sobre o valor da operação (entretanto, não há mais disposição sobre a apuração da base de cálculo nas transferências, já que §4º do art. 13 da LC 87/96 foi declarado inconstitucional e está sendo revogado pelo próprio art. 2º do PLP 116/23);
Possibilidade de opção pelo contribuinte de destaque do ICMS na operação de transferência interna e interestadual, o que poderia evitar impactos sobre eventuais benefícios fiscais já concedidos.
Entre as diversas implicações decorrentes da publicação do Convênio ICMS nº 174/2023, importante pontuar que é inegável que o convênio disciplinou matérias de competência exclusiva de lei complementar, em desacordo com o artigo 146, III da CF/88 e conforme determinado pelo próprio STF no julgamento da ADC 49. Aparentemente, a edição da norma decorreu da ausência de garantia de aprovação do PLP 116/23 até o início de 2024. Ocorre que, ao assim proceder, os Estados editaram norma que também poderá ser objeto de questionamento quanto à sua constitucionalidade, da mesma forma como ocorreu com a LC 87/96. Ou seja, a edição do referido Convênio poderá levar o mesmo fim que a questão do DIFAL para não contribuintes: a urgência na disciplina da matéria levou os Estados a avançar na competência do legislador complementar e a editar o Convênio 93/15, contudo, em razão da sua declaração de inconstitucionalidade (Tema 1093), foram obrigados a respeitar a Constituição e tratar a questão por meio da Lei Complementar 190/22.
Parece-nos que a urgência dos Estados poderia ter sido melhor acomodada até a edição da competente lei complementar se as normas previstas em Convênio fossem de caráter optativo para os contribuintes, como ocorreu com a definitividade da substituição tributária, especialmente se considerado que o STF entendeu pela possibilidade de os contribuintes transferirem os créditos para o destino, o que se tornou obrigatório nos termos do Convênio.