STF nega direito de aproveitamento de créditos de uso e consumo por exportadores

O STF finalizou, no final da última terça-feira (07.11.2023), o julgamento virtual do RE nº 704.815 (Tema 633), com o provimento do Recurso do Estado de Santa Catarina e aprovação da tese de repercussão geral, que nega, nas operações de exportação, o aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes de aquisições de bens destinados ao ativo fixo de uso e consumo da empresa, que depende de lei complementar para sua efetivação.

A discussão teve origem em ação mandamental impetrada pelo contribuinte Frame Madeira, que buscava assegurar o seu direito de, após a promulgação da EC 42/2003, que alterou o art. 155, §2º, X, “a”, da CF/88, apropriar créditos de ICMS, proporcionalmente às operações de exportação, em relação a todas as mercadorias adquiridas com a incidência do imposto, inclusive bens de uso e consumo, independente da sua incorporação ou desgaste no processo produtivo.

O Relator, Ministro Dias Toffoli, havia votado pela constitucionalidade do creditamento, desde a entrada em vigor da Emenda Constitucional 42/2003, por entender que o seu objetivo, com a imunização da incidência do ICMS na origem e garantia do direito à manutenção dos créditos, foi assegurar que a tributação ocorresse no destino (país importador), medida que se presta a assegurar a não cumulatividade e impedir a exportação de tributos, incentivando as exportações e a concorrência.

Para o Relator, a lógica do creditamento na exportação, que obedeceria a regra da tributação no destino, seria distinta daquela que orienta a tomada de créditos nas operações internas, para as quais o Supremo já validou a limitação da não cumulatividade por Lei Complementar. Em razão disso, seria admitida a manutenção dos créditos de bens destinados ao uso e consumo do estabelecimento, quando vinculados à exportação (aplicação do conceito de crédito financeiro para a exportação). O Relator foi acompanhado pelas Ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia, e pelos Ministros Edson Fachin e André Mendonça, o que formou um placar de 5 votos favoráveis à tese do contribuinte.

Todavia, prevaleceu a divergência instaurada pelo Ministro Gilmar Mendes, que foi acompanhado pelos Ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Nunes Marques, configurando a maioria de 6x5 contrária aos contribuintes.

Segundo Gilmar, a alteração constitucional promovida pela EC 42/03 não teria rompido com o modelo tradicional validado pelo Supremo, segundo o qual o creditamento do ICMS seria regido pelo crédito físico (restrito aos bens tributados que se integrem fisicamente à mercadoria). Todavia, haveria a possibilidade de a legislação complementar ampliar as possibilidades de compensação e creditamento do ICMS, de maneira a adotar o crédito misto ou mesmo o crédito financeiro em sua inteireza.

Nesse contexto, o Ministro entendeu que a alteração constitucional, por si só, não teria revogado as restrições constantes da LC 87/96, até mesmo porque, o art. 155, §2º, XII, “c”, da CF/88 delega à legislação complementar a disciplina do regime de compensação do imposto (não cumulatividade). No seu voto, Mendes registrou que “tamanha ruptura não pode ser inferida a partir do princípio da não exportação de tributos, devendo estar expressa no texto constitucional” concluindo que “as imunidades relacionadas à exportação que são albergadas pela nossa Constituição Federal desde a sua redação originária trazem, sim, como princípio norteador a ideia de não exportar tributos. Mesmo assim, essa lógica não dispensa a edição de regras específicas que confiram clareza quanto ao seu alcance. Vale dizer, o princípio da tributação no destino não fora adotado pela nossa Constituição a partir da EC n. 42/2003, a representar uma ruptura com a interpretação constitucional até então vigente”.

O Ministro Alexandre de Moraes apresentou voto acompanhando a divergência instaurada por Gilmar. Também para Moraes a lógica do creditamento, conforme previsão constitucional, seria o direito ao crédito físico, ou seja, “somente os bens que integram fisicamente o produto são beneficiados pelo creditamento do imposto, pois são esses que sofrem a incidência do imposto ao longo de toda a cadeia de contribuintes até o consumidor final”.

No mesmo sentido, concluiu que “é possível que a Constituição ou a legislação complementar específica institua a técnica de créditos financeiros a bens que não se integram à mercadoria a ser exportada, ou sejam bens incorpóreos, tais como, sobre bens do ativo fixo ou imobilizado, energia elétrica, serviços de telecomunicação, combustíveis e lubrificantes, peças e acessórios de máquinas e veículos, materiais de limpeza, equipamentos de proteção, como fez a LC 87/1996, nos seus art. 19, 20, e 33, para as operações internas”.

O que se extrai dos votos vencedores é que a não cumulatividade do ICMS deve observar o regramento previsto em Lei Complementar, seja quando há restrição ao crédito, seja quando há ampliação do direito ao crédito.

A partir dessa premissa, firmou-se o entendimento de que o direito ao crédito de ICMS nas exportações, mesmo após alterações promovidas pela EC 42/03, deve observar o regramento infraconstitucional, qual seja, a LC 87/96. Dessa forma, não se admitiu o crédito de bens de uso e consumo, ainda que vinculados a produtos exportados, uma vez que o creditamento nessa hipótese tem sido prorrogado pela legislação complementar (previsão de vigência em 2033).

Vale observar que um embate que ainda segue vivo entre Fisco e contribuintes é a possibilidade de creditamento sobre produtos intermediários que não se agreguem fisicamente à mercadoria, mas que estejam inseridos no processo produtivo, consumindo-se integralmente ou sofrendo desgaste no processo. No recente julgamento do EAREsp nº 1775781/SP, o STJ entendeu que geram direito ao crédito de ICMS os materiais empregados no processo produtivo, produtos intermediários, inclusive os consumidos ou desgastados gradativamente, desde que comprovada a necessidade de sua utilização para o objeto social da empresa, afastando a necessidade de vinculação física entre a mercadoria e os produtos intermediários.

Nossa Equipe tem acompanhado de perto as discussões e está à disposição para qualquer esclarecimento.